24 maio, 2013

Um Pequeno Esclarecimento (ou, Preconceitos Que Não São Argumentos)

Caríssimas,

Sobre as recentes "personalidades" que se têm destacado na televisão contra a adoção por casais do mesmo sexo, temos um pequeno esclarecimento a fazer:

Este assunto não é uma questão de opinião.

Temos muita pena, Miguel Sousa Tavares, António Marinho e Pinto, e restantes pessoas que gostam de invocar os seus pensares sobre este assunto.

Ser-se contra a adoção por casais do mesmo sexo não é uma questão de opinião; é, sim, uma questão de ignorância e de preconceito. Não se é, portanto, "uma pessoa com argumentos". É-se antes (as palavras são outras bem menos bonitas) um alguém homofóbico, ignorante ou, simplesmente, perigosamente desinformado.

E tal como nas anteriores discussões históricas relativas a outras conquistas de direitos fundamentais (o direito à família é um direito fundamental) relembramos que todos aqueles que na altura se opuseram ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, ao casamento "inter-racial", ao direito de voto das mulheres e restantes outras conquistas, também neste caso estes "opinadores carismáticos e defensores dos bons valores tradicionais!" aprenderão com a história. O tempo e a sua boa perspectiva - que tão bem têm resultado neste campo - demonstrarão a estas pessoas que são apenas um conjunto de tristes trogloditas assustados, desinformados e muitíssimo arrogantes. E eles, se tiverem vergonha na cara, esconder-se-ão.

No Bichas, no entanto, achamos que até aos trogloditas é necessário ajudar. Não desistimos de lhes mostrar como estão errados "os argumentos" que usam, e, mais que isso até, queremos sobretudo ajudar a bicharada a equipar-se de contra argumentos inteligentes que lhes deixem entrar de cabeça erguida em todos os debates que se criaram nestas últimas semanas sobre este tema. Por isso, compilámos em baixo os preconceitos (que não são argumentos) que por aí se usam e respectivas desconstruções.

Sem mais demoras,  lógica para pessoas com mais de dois neurónios na cabeça.

PRECONCEITOS QUE NÃO SÃO ARGUMENTOS:


  1. Referir que este assunto é sobre os "direitos dos homosexuais" a sobreporem-se ao sobre o Superior Interesse da Criança não está certo porque:

    » As duas coisas estão intrinsecamente ligadas. Os direitos das pessoas LGBTQ são também os direitos das suas crianças e os direitos das crianças estão também dependentes das liberdades e da igualdade jurídica que o Estado confere e reconhece às suas mães e pais. Como é que protegemos uma criança se não lhe reconhecemos as suas figuras parentais e se lhe retiramos uma delas quando algo acontece à outra?

    » Este raciocínio ignora também completamente o facto de que todos os homo*sexuais já foram também crianças (e que as crianças também são homosexuais!) e que as coisas não podem ser desligadas umas das outras. Afinal de contas, direito da família é isso mesmo;

    » O reconhecimento de direitos fundamentais a um grupo de pessoas na sociedade é sempre uma coisa positiva e não irrelevante como a frase sugere. Então e se fosse "só" mesmo pelos "direitos dos homosexuais" sem influenciar mais nada (como em baixo veremos que os estudos demonstram)? Não era uma coisa positiva? Igualdade, justiça, etc?;

    » Este raciocínio ignora que a adoção (seja por quem for) é SEMPRE sujeita ao critério do "superior interesse da criança" supervisionado por técnicos, psicólogos, e pessoas cuja o trabalho e garantir exactamente isso;

    » E, finalmente, sugere também esse contra senso de que não é no total interesse das crianças retirá-las de instituições e dar-lhes antes famílias que as amem e que queiram cuidar delas. Aliás, existirá coisa mais importante para uma criança que o direito a ter uma família?; 

  2. Trazer a história da "família natural" (e analogias paternalistas da sementinha) sugerindo sem sugerir que os casais inférteis e que as famílias monoparentais também não merecem o direito à parentalidade e à adoção.

    E ignorando também que no reino animal (que acaba por ser sugerido nestes artgumentos também) a forma de organização da parentalidade é infinitamente mais diversa que a nossa e que não segue, nem de perto nem de longe, este pseudo modelo do homem + mulher + criança;

    "Os homens e as mulheres são diferentes as crianças precisam dos dois modelos", continuam eles nestes argumentos que novamente ignoram as familías monoparentais. E aqui o problema é que estas pessoas ignoram que o mundo já aprendeu algumas coisas sobre feminismo e sexismo e já conseguimos descontruir na ciência esses mitos do "os homens são de Marte e as mulheres de Venus e complementam-se na perfeitção". Recentes estudos após estudos demonstram que não existem diferenças naturais relevantes na forma de agir e pensar entre ambos os sexos e que as que existem são motivadas e estimuladas pela sociedade.

  3. A mentira da relatividade dos estudos e "dos estudos contrários" que desaconselham a adopção por casais do mesmo sexo. Isto é simples. O que existe é o colossalmente contrário, existe um consenso científico relativamente a este tema que prova que não existem diferenças significativas relativas ao desenvolvimento das crianças criadas por casais do mesmo sexo face às criadas por casais de sexo diferentes e que, inclusive, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos corrobora.

    Quando existem estudos contrários, o que acontece é que são normalmente baseados em estudos antigos como o famoso caso do Spitzer, em que o autor voltou atrás e rejeitou as suas próprias conclusões, ou então são encomendados por organizações que defendem a "reconversão" das pessoas LGBTQ em espécies de campos de concentração como o caso na Africa do Sul (onde ainda no mês passado dois miúdos foram torturados e mortos por não serem "suficientemente masculinos");

  4. Sugerir que as crianças não estão assim tão mal nas instituições e que antes lá que "nas mãos dos homossexuais!". Argumentos destes são profundamente ignorantes e só são mesmo proferidos por pessoas que não fazem a mais pequena ideia do sofrimento das crianças que não têm famílias e do desespero elas têm em encontrar quem lhes dê amor, protecção e afecto;

  5. Quando intuem frases do tipo "mas estes agora também querem adotar?!" e sugerir que isto é "experimentalismo social" como se fosse uma coisa nova e como se as nossas famílias não existissem desde sempre. Somos e sempre fomos filh@s, mães, pais, irmã/os e pessoas com desejo e capacidades de parentalidade. A sociedade acordou agora para esta realidade mas esta não é uma reivindicação nova. (Porque também não foi só quando as mulheres puderam votar que começaram a pensar.)

  6. E, finalmente, quando atiram as pérolas do "eu não tenho nada contra, mas.." e o fantástico "eu até tenho amigos gays, mas.." que são só e apenas formas do mais estúpido que há de esconder e mascarar homofobia e de demonstrar um total desrespeito uma grande parte da população do mundo (mesmo quando começam as frases com "eu respeito e aceito, mas.."). Tratam-nos seus discursos como "os outros", "os estranhos" e "os perversos", "que não fazem parte desta sociedade" como se não fossemos nós fundamentalmente pessoas que existem e que têm os exactos mesmos desejos, necessidades e sonhos que outra pessoa qualquer.


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Exemplos televisivos dos dejectos acima refutados a seguir. Recomenda-se calma.







Basicamente:


E pronto. Línguas afiadas e até uma próxima. (não os deixem sem resposta). 

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